quarta-feira, 14 de julho de 2010

Capoeira Angola, do ostracismo à mundialização ( 1980-2009) Monografia

A CAPOEIRA ANGOLA: DO OSTRACISMO Á MUNDIALIZAÇÃO – CONFORMAÇÕES DE UM PROCESSO (1980 -2006)









Salvador/2007
Fábio Oliveira Nascimento






A CAPOEIRA ANGOLA: DO OSTRACISMO Á MUNDIALIZAÇÃO – CONFORMAÇÕES DE UM PROCESSO (1980 -2006)





Trabalho de graduação feito por Fábio Oliveira Nascimento, apresentado ao Departamento de História, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais – UcSal, sob orientação do professor Dr. Vilson Caetano de Souza Júnior, com o objetivo de obter o título de Bacharel e Licenciado em História.





Salvador/2007



Agradecimentos








Iê!




Aos Orixás, começo, meio e fim...

Á Yá Marlene Rodrigues, minha Mãe

Ao Mestre Jogo de Dentro, meu Mestre


À minha família pequena, Á minha família grande

Ao Núcleo de Estudantes Negr@s da UcSal – Makota Valdina


Ao Professor Vílson Caetano Júnior


Aos Colaboradores, Mestre Moraes Trindade, Mestre Valmir Damasceno, Mestre Jogo de Dentro, Frede Abreu


A Miles Davis, Sarah Vaughan, Billie Holyday, Fela Kuti, Jorge Aragão, Céu, Racionais, Nina Simone e Bob Marley, companheiros das horas de escrita...












Sumário


Introdução................................................................................ 05


Capítulo I................................................................................. 08


Capítulo II................................................................................ 13


Capítulo III............................................................................... 17


Capítulo IV............................................................................... 22


Capítulo V................................................................................ 24


Conclusão................................................................................. 36


Fontes........................................................................................ 39


Bibliografia............................................................................... 40











Introdução




No ano de 2007, os capoeiristas ( de ambos os estilos), se confrontaram novamente, com a discussão relativa ao interesse exposto por algumas correntes políticas, acadêmicas e mesmo de capoeiristas, em submeter o ensino da Capoeira (em conjunto com outras expressões físicas e culturais, como o Tai Chi Chuan, a Ioga, o Pilates, entre outros) à direção e fiscalização dos Conselhos Regionais e Federais de Educação Física. Curiosamente, uma expressão cultural historicamente discriminada e marginalizada, se torna objeto de interesse e disputa conduzida justamente pelas camadas sociais que anteriormente a discriminaram. Tratando-se de Capoeira Angola, esse interesse se torna ainda mais estranho, por esta ser uma modalidade de prática cultural, que não se aproximou historicamente, do desporto ou da atividade técnica esportiva, estando sempre vinculada à manifestação das práticas populares, vadiação, no termo usado pelos próprios capoeiristas.

È no âmbito da discussão acima referida, que surge o interesse em investigar, de que forma, uma expressão/manifestação cultural tida como retrógrada e marginal, vem a se tornar prática positiva plenamente aceita e disseminada pelos cinco continentes do planeta. Em se tratando da Capoeira, essa investigação, que não traz em si nenhuma novidade temática, toma, no entanto, feições diferenciadas, pelo fato dela, a Capoeira, já ter passado por um processo anterior de diálogo, transformação, adequação e filtragem para a sua aceitação/positivação social, tendo sido a Capoeira Angola justamente, o componente descartado por esse processo de filtragem, o que não pôde anteriormente ser “modernizado”, nem traduzido para uma linguagem “civilizada”, que permitisse a sua fruição por parte dos setores médios e altos da nossa sociedade.

A percepção da importância de uma abordagem social para o estudo da cultura, para que se possa alcançar uma compreensão profunda das sociedades, percebidas na dinâmica de suas contradições e dos diversos setores que lhe fazem parte, é fundamental para que se perceba a importância de que existam no Brasil estudos centrados na história da Capoeira, entendida enquanto expressão cultural socialmente contextualizada, que compreende em seus modos de produção e reprodução, amostras das construções sociais, históricas e psicológicas utilizadas pelos setores sociais nela envolvidos para agir e reagir dentro de um sistema social também dinâmico, estabelecendo práticas, percepções, discursos, representações e relações, que podem ser apreendidas enquanto vieses do processo histórico brasileiro, marcadamente, no século XX.

Nesse sentido, a Capoeira, pelas características de sua história, se estabelece como plano ideal para a percepção de formas utilizadas pelos setores subalternos da sociedade brasileira para se situar e atuar no cenário opressivo da sociedade brasileira. Mais ainda, quando essa prática outrora marginalizada, ascende ao patamar de prática cultural socialmente aceita e incentivada e, mais ainda, quando é justamente o seu setor mais tradicionalista e historicamente relacionado com as camadas mais pobres dessa sociedade, que vai ser alçado ao grau de referência socialmente positiva, e ser personagem de um processo de disseminação internacional, comercialmente e institucionalmente respaldado.

Estudar o processo de mundialização da Capoeira Angola, desde o ostracismo a que esteve relegado nos anos oitenta, até a sua atual fase de disseminação mundial e institucionalização, nos ajuda a perceber as modificações internas experienciadas pelos Capoeiristas Angoleiros enquanto grupo específico, em diálogo com a sociedade brasileira em geral, percebendo também aí, as mudanças de percepção e estrutura que possibilitaram (ou que foram forçadas) pra que essa transformação ocorresse, o que nos permite, desse modo ampliar a nossa percepção dos processos históricos da sociedade brasileira, enquanto cenário de conflitos e contradições, em constante movimento e adaptação.

Para a construção deste trabalho, dialogamos com a antropologia, utilizando autores como Roberto DaMatta e Waldeloir Rego, entre outros, buscando enriquecê-lo com uma disciplina que em muito tem contribuído com a História, apresentando abordagens diferenciadas e abrangentes, nos proporcionando os frutos de uma interdisciplinaridade há muito presente na prática da História. Entretanto esta pesquisa tem como referência teórica, a História Social Inglesa, nominalmente, a partir das obras de Edward Thompson, em sua disposição para contar a história daqueles que a história oficial não está habituada a enfocar, sem perder nessa narrativa a ligação com os papeis políticos e sociais exercidos por esses sujeitos, contextualizados no corpo de uma sociedade em permanente conflito hegemônico.

Embora não tenhamos tido contato, durante a pesquisa, com teses, livros, ou trabalhos outros dedicados ao estudo específico da nossa temática (o processo recente de popularização mundial da Capoeira Angola), e isso nos tenha forçado a alongar um pouco as contextualizações e principalmente a análise e reprodução das entrevistas, tivemos relativa facilidade em sua produção devido à proximidade e vida de Mestres e pesquisadores que vivenciaram, atuaram e conduziram diretamente o processo aqui enfocado. Além disso, dispusemos de toda a boa vontade do Senhor Frederico Abreu, coordenador do Instituto Jair Moura, em Salvador (que é simplesmente o maior acervo mundial sobre capoeira, com mais de trinta mil documentos históricos), o que nos facilitou bastante a vida, posto que a pesquisa, desenvolvida durante todo o ano de 2007, teve este Instituto como sede

No primeiro capítulo deste trabalho, nos ocupamos em propor algumas reflexões em torno de conceitos básicos sobre a Capoeira, como origens e geografia, além de apresentar um breve histórico da Capoeira, desde o século XVII até 1930, com a criação da Capoeira Regional, que complementamos no segundo capítulo, com um histórico da Capoeira Angola, até os anos de 1980.

No terceiro capítulo, a análise cronológica, dá espaço para a contextualização da Capoeira, relacionando-a ao processo histórico e social brasileiro na qual esteve inserida enquanto fenômeno urbano, dando maior ênfase, ao período que vai desde 1930, até 1980, e que compreende a criação e ascensão da Capoeira Regional, e a decadência da Capoeira Angola.

No quarto capítulo, realizamos uma breve contextualização sócio-política da década de 1980, período de abertura política pós-militarismo, no qual a Capoeira de Angola inicia o seu processo de revitalização, como fenômeno bem característico desse período.

No quinto e último capítulo, procuramos a partir de depoimentos recolhidos para esse trabalho, com o pesquisador Frede Abreu, e com três Mestres de Capoeira diretamente envolvidos no processo estudado, examinar minuciosamente o caminho mesmo de revitalização da Angola, seu histórico, seus personagens, seus espaços cruciais, seus discursos, suas estratégias e suas contradições, de modo a possibilitar um quadro vívido deste processo, relacionando essas informações testemunhais, com as informações contextuais e históricas acumuladas no decorrer do trabalho.

De todo modo, temos consciência das limitações de um trabalho monográfico, e esperamos que o processo de revitalização da Capoeira Angola, possa vir a ser mais profunda e atentamente estudado, sendo que esperamos estar contribuindo com a nossa parte, ainda que somente apontando direções.

Capítulo I

Breve Histórico da Capoeira




Longa foi a epopéia da nobre arte da Capoeira para chegar aos dias atuais da forma que chegou. De crime previsto no Código Penal a prática pedagógica em escolas públicas. De vadiação de carroceiros e estivadores a malhação das filhas da elite, nas mais caras academias de ginástica. Por longos e tortuosos caminhos, a Capoeira conseguiu chegar ao Século XXI, como expressão cultural de importância social amplamente reconhecida, seja por seu profundo conteúdo simbólico, no que se refere à preservação do patrimônio cultural tradicional das populações descendentes de africanos no Brasil, seja pelo caráter multi e inter-disciplinar que envolve a sua prática.

Ainda que a Capoeira tenha a sua permanência e disseminação positiva, historicamente ligada à capacidade intestina da comunidade negra em preservar e manter as suas expressões culturais e valorativas, às custas de um permanente diálogo com a sociedade que a cerca (e em alguns momentos o termo “cerca”, é literal), é antiga a relação direta entre a Capoeira e os poderes públicos, sendo que os Editais de apoio financeiro federal para projetos de capoeira, bem como o reconhecimento de seus Mestres enquanto “ Mestres da Cultura Popular”, a partir da primeira década deste Século XXI, representam um marco histórico nessa relação, o que parece indicar um amadurecimento desta, a partir de uma conceituação mais inclusiva de cidadania no Brasil.1

Aspectos diversos do processo que levou a Capoeira desde os artigos do Código Penal Republicano, dos fins do Século XIX2, aos editais federais de financiamento, vêm sendo investigados de maneira eficiente por diversos pesquisadores, entre os quais, podemos citar o antropólogo Waldeloir Rego, o economista Frederico Abreu e historiadores como Carlos Eugênio Líbano Soares, Josivaldo Pires, Augusto Liberac, Adriana Dias, cada um com um enfoque determinado, sendo referenciais, não somente para este, mas para a quase totalidade de trabalhos acadêmicos escritos atualmente sobre a Capoeira.3

Mesmo que não haja unanimidade entre os autores quanto às origens da Capoeira, o que se deve tanto á escassez de registros, quanto á diversidade de interpretações acerca do assunto, podemos fixar alguns indicativos que nos servirão como bases para podermos nos ocupar sobre o século XX, no qual se desenrolou grande parte do enredo que nos interessa.

Primeiro, que a Capoeira é uma expressão cultural de origem negro-africana, embora haja discordância se é genuinamente africana ou afro-brasileira, nos inclinamos a afirmar com Soares, se tratar de um agrupamento de expressões marciais africanas, “que se teriam amalgamado em definitivo na terra americana” (SOARES, 2004, p. 16). Segundo que a partir do Século XVII, a Capoeira se desenvolve no contexto das cidades mais urbanizadas e de comércio mais desenvolvido, notadamente: Salvador, Rio de Janeiro, Recife e Belém, importantes cidades portuárias, bem como nas cidades do recôncavo baiano, então pólo do intenso processo produtivo/comercial do ciclo do açúcar e da distribuição de viveres para Salvador.(SOARES, 2004, p. 17)

Terceiro, que nesses espaços urbanos, a Capoeira adquire status de ameaça à ordem e à segurança públicas, na esteira das políticas governamentais de restrição e perseguição às práticas culturais afro-brasileiras, perseguição esta que, no caso específico da capoeira, se intensifica a partir da proclamação da República, quando a capoeira, a Capoeiragem e os capoeiristas, passam a estar criminalizados pelo Código Penal de 1890. Considerando que, o peso dessa perseguição se distribuiu de maneira diversa nas diferentes áreas citadas, percebemos que a Capoeira (sua existência em si) se choca com o discurso oficial progressista e positivista (e logo higienista e eugenista) da República Brasileira. (PIRES, 2005, p.121).

São brilhantes e abrangentes os trabalhos de Soares, relativos á Capoeira carioca no final do período imperial, o de Pires e o de Dias 4, referentes ao período da primeira metade do Século XX na Bahia. O primeiro, realiza um amplo levantamento de dados referentes aos capoeiristas cariocas do império, possibilitando a partir dos registros policiais da época, a identificação mais próxima dos componentes desse grupo, suas origens étnicas, ocupações profissionais, distribuição geográfica no contexto urbano, entre outros pontos, como tipos de ocorrências policiais registradas e a relação dos Capoeiras com as temíveis “Maltas de Capoeira5, que nos permitem a compreensão mais ampla do panorama urbano carioca do Século XIX, tendo os Capoeiristas como protagonistas.

Já Pires e Dias, em obras muito próximas, utilizam, além dos registros policiais, notícias publicadas em jornais baianos do período compreendido entre a proclamação da República e a Segunda Guerra, oferecem um quadro ilustrativo do modus vivendi dos capoeiras baianos, descrevendo o seu habitat, nomeando personagens. Josivaldo Pires, dedica ainda um capítulo do seu “No Tempo dos Valentes”, para contextualizar a ação dos vadios e capoeiras no cenário político e econômico brasileiro na 1ª República, examinando o conteúdo dos discursos hegemônicos da época, referentes à análise social, que viriam a fundamentar o projeto de sociedade então levado a curso, as relações entre o Estado e as classes subordinadas, dando relevância às aspirações eugenistas e lombrosianas que influenciaram as relações supracitadas. ( PIRES, 2005,pp. 116-126).

Expressão cultural marginalizada e perseguida no período colonial e durante o Império, criminalizada na República, a capoeira vai experimentar, a partir dos anos 1930, um processo de superação das barreiras sociais em que estava encerrada, passando a atingir e ser aceita por um novo público, oriundo de extratos sociais diferenciados daqueles nos quais estava usualmente inserida. O ponto crucial para essa reviravolta na história da Capoeira, foi a criação em 1926, por Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, da Luta Física e Regional Baiana, posteriormente conhecida como Capoeira Regional.(REGO, 1968, p.268)

Com o intuito de tornar a Capoeira mais socialmente aceitável e marcialmente objetiva, Mestre Bimba inseriu na Capoeira, golpes de outras lutas, como o Jiu-Jitsu, o Boxe e o Savate ( Citar discordâncias nesse ponto), modificou a postura tradicional do jogo de chão, baixo, para uma prática mais ereta, alta, além de inserir no processo de aprendizagem, técnicas sistematizadas de ensino, como as seqüências de treinamento, uma metodologia didática e funcional para o desenvolvimento prático do aluno. Mais significativo ainda, no que podemos ter como primeiro momento de disseminação social da Capoeira, o Mestre Bimba introduziu no âmbito da sua Capoeira Regional, todo um aparato de ritos e cerimoniais similares aos das universidades (D´ANDRADE,2006, p.58) que vão desde o estabelecimento de uma hierarquia de graduações, que testificam a transposição pelo aluno, das progressivas fases do aprendizado, até a realização de festas de batizado para os alunos iniciantes e de formatura para os alunos que atingiam determinado grau na sua academia.

Se, segundo o próprio Mestre Bimba, a Capoeira era até então “coisa para carroceiro, trapicheiro, estivador e malandro” (ABREU, 2005, p.7), a partir das adaptações técnicas e simbólicas por eles implementadas, passa a atrair uma nova clientela, provenientes das classes média e alta, principalmente formada por estudantes universitários, que logo se tornariam médicos, advogados, engenheiros e políticos de importância regional e nacional.

É por intermédio desses alunos, que o Mestre Bimba vai ter viabilizado o reconhecimento social da sua Capoeira, inaugurando em 1930 a sua primeira academia e recebendo em 1937, um certificado oficial da Secretaria da Educação, Saúde e Assistência Pública, qualificando a Capoeira Regional como educação física e concedendo-lhe permissão para o seu ensino em recinto fechado.

O Mestre Bimba foi um homem que fez o seu tempo. Analfabeto, negro, pobre, conseguiu alçar a sua arte do status de “perigo social, para o de ”esporte nacional”(DIAS, 1996, p.79). Deu aulas de Capoeira para militares e acadêmicos , esteve por muito tempo presente nas páginas da imprensa local como lutador imbatível, apresentou sua arte em praças e palácios, para prefeitos, interventores, governadores e até mesmo para o Presidente Getúlio Vargas, que a declarou como “única colaboração genuninamente brasileira à educação” ( D´ANDRADE, 2006,p. 56), indicando o seu ensino nas escolas públicas.

Além de ministrar aulas para jovens oriundos da elite soteropolitana, Bimba teve também entre os seus clientes, filhos de fazendeiros, cacauicultores, políticos e pecuaristas de outras cidades baianas, que travavam contato com a capoeira, durante o seu período de estudos na capital, tornando-se importantes disseminadores do seu estilo de Capoeira ao retornarem para as suas cidades, ou transferirem-se para o sul do país (D´ANDRADE, Op.Cit, p.59). O Mestre frequentemente viajava para essas cidades, a fim de realizar batizados e formaturas, bem como shows e apresentações em clubes de elite, em festas oficiais. Em Salvador, também era solicitado para apresentações em teatros, desfiles cívicos, e cerimônias diversas.

Mestre Bimba era uma espécie de Herói da Bahia, embora por fatores diversos, não tenha sido ele mesmo grande beneficiário de sua obra. Tanto que em 1973, alegando a falta de apoio e assistência do governo baiano, parte para Goiás, acreditando nas promessas de um aluno de que lá ganharia muito dinheiro, vindo a falecer neste estado em 1974, pobre e desassistido. A Capoeira regional, no entanto tem a sua continuidade garantida pelos médicos, advogados, cirurgiões, políticos e engenheiros, feitos capoeiristas pelo Mestre Bimba. São esses que vão formar( no sentido de transmitir formação), a terceira geração de capoeiristas regionais, responsáveis por consolidar a institucionalização da Regional e sua disseminação por todo o país.

Desde fins dos anos 1960, muitos dos capoeiristas regionais baianos, vão integrar as equipes de shows folclóricos, como o Grupo Folclórico da Bahia, de Ubirajara Almeida, Mestre Acordeon, e o Viva Bahia, de Emília Biancardi, que vão percorrer Europa e América do Norte, apresentando demonstrações de Capoeira, em conjunto com danças-afras e outras expressões “folclorizadas” (REGO, 1968, p.238). Alguns entre esses Mestres, vão se estabelecer na Europa e na América iniciando o que podemos entender como segundo momento da disseminação da Capoeira Regional, quando os primeiros Mestre de Capoeira vão iniciar trabalhos no exterior.

Segundo o Mestre de Capoeira e Doutor em Comunicação e Cultura pela UFRJ, Nestor Capoeira, é nessa época que vai ocorrer uma nova e importante transformação na regional, com a agregação de inovações trazidas por jovens capoeiristas do eixo Rio - São Paulo, definindo um novo estilo para a Capoeira Regional, integrando ainda novas contribuições de outros esportes, como os saltos e acrobacias da ginástica olímpica.6

É essa a Capoeira que vai se tornar hegemônica no Brasil(mesmo na Bahia) e ser exportada para a Europa e Estados Unidos, estando presentes em mais de uma centena de países de todos os continentes. Tão significativa é esta modificação, que alguns pesquisadores da Capoeira, afirmam que o Mestre Nenel, filho do Mestre Bimba, seria um dos únicos Mestres que preservam ainda a Capoeira Regional, da forma como era praticada por seu pai. Para outros, no entanto, a transformação, é pressuposto em si do projeto do Mestre Bimba e a posição do Mestre Nenel, representaria um contra-senso.7

O fato é que desde 1940, a Capoeira Regional se disseminou com sucesso por todo o país. A partir dos anos 1970, esse sucesso alcançou os cinco continentes, consolidando uma gigantesca estrutura econômica de viés empresarial, que pode ser exemplificada por encontro recentemente realizado em Salvador pelo Grupo Abadá Capoeira, do Mestre Camisa, que reuniu cerca de 5 mil capoeiristas de mais de trinta países, que eram, em sua maioria, alunos de filiais do Abadá Capoeira espalhados pelos cinco continentes8. Em contrapartida, a Capoeira Regional experimenta também desde os anos 1970, sua popularização, pulverizando-se por todos os bairros pobres e de periferia do país. Isso, na nossa perspectiva, representa menos uma ‘deselitização’ da Regional, do que a disseminação padronizada do modelo hegemônico, tido como ideal e veículo de ascensão sócio-econômica, tendo em vista o excelente mercado de trabalho internacional aberto por essa Capoeira.


Capítulo II
A Capoeira Angola



A partir de 1930, com a criação da Capoeira Regional, a Capoeira até então praticada, passa a ter sua história significada através da contraposição à sua modalidade hegemônica. O “sua”, é referente ao fato evidente de que a Regional é derivada dessa Capoeira, uma modalidade para a sua prática. No entanto, é essa Capoeira anterior, que vai ser obrigada a definir-se por contraste. O Próprio termo “Capoeira Angola”, que relaciona a prática à sua origem africana, definindo inclusive, uma especificação étnica, se dá posteriormente à criação da Regional, e com a função objetiva de diferenciar-se dela. Antes disso, o que se tinha era “a” Capoeira, e sua prática era a capoeiragem, a vadiação pura e simples ( REGO,1968, p.19).

A Capoeira Angola, passa a desempenhar o papel de contraponto à Regional. Esse papel se exerce de forma consciente e deliberada por parte dos Mestres da Angola , que optam por insistir na preservação das práticas tradicionais da Capoeira, bem como de uma estrutura de valores, conceitos e rituais diretamente ligados ao mundo simbólico africano. O momento inicial da cisão da Capoeira, é o momento o qual os sujeitos sociais envolvidos, buscam definir os seus discursos, de modo a referendar e justificar as suas práticas a partir de um aporte conceitual que baseie e dê sentido às suas especificidades. Ainda que não seja o nosso objetivo a realização de uma análise do discurso no presente caso, nos parece importante ressaltar, ter sido sobre essa base discursiva inicial, que se desenrolou a fiação da trajetória capoeirana no Século XX e nesse início de XXI. Justamente, no contraste entre cultura negra X Cultura brasileira , cultura popular X cultura de elite , expressão cultural x desporto, vadiação x educação física , ritualística com ritual africano x ritualística com referencial europeu, que se deu em graus variados e variantes a relação de co-existência entre as duas capoeiras.

No entanto, a despeito dessas contradições e da gravidade empírica delas resultantes , como brigas de ruas e restrições sobre a visitação mútua , algo de diálogo e negociação se estabeleceu no reino da Capoeira. Exemplo disso, é a utilização pelo grupo da Capoeira angola, de alguns espaços e linguagens de inserção/intermediação abertos pelo grupo da Regional. Em 1941, o Mestre Pastinha abre a sua academia de capoeira, incorporando alguns padrões simbólicos, como a exigência do uso de uniforme, o registro cartorial da entidade, as carteirinhas de associados, que representam uma clara ruptura para com o caráter espontâneo, não institucional e, necessário dizer, marginal da capoeiragem clássica. Além disso, a utilização de seqüências de treinamento , representam também uma inovação relativa ao processo de aprendizado da Capoeira Angola, até então pautado nos processos de transmissão comunitários de conhecimento, baseados na oralidade e no exemplo.

Desde os anos 1940, além da academia do Mestre Pastinha, houveram outras, como a do Mestre Waldemar, do Mestre Caiçara, do Mestre Canjiquinha, do Mestre Bobó, do Mestre Cobrinha Verde, do Mestre Espinho Remoso, do Mestre Ferreirinha, de Santo Amaro, entre outros.9 Esses Mestres, são representantes da geração de Mestres de Capoeira Angola, que formou a quase totalidade dos mestres que, nos dias de hoje, são tidos como sendo “os velhos guardiões da Capoeira Angola”, como os Mestres: João Pequeno, João Grande, Curió, Boca Rica, Mestre Bigodinho, Mestre Lua de Bobó, Mestre Virgílio, e o falecido Mestre Paulo dos Anjos, todos esses em uma faixa de idade que varia entre 60 e 90 anos. São senhores cuja memória histórica imediata ( que se soma á dos seus avós), alcança cerca de 150 anos, o que nos relaciona a um período que é, contemporâneo à escravidão, anterior aos impactos da revolução industrial no Brasil, e mais ainda, às revoluções tecnológica e informática. Por conta disso, são justamente considerados como portadores de imenso saber e proprietários de laços estreitos com a ancestralidade africana no Brasil.

Alguns entre esses Mestres, vivenciaram diretamente o processo de hegemonização e disseminação da Regional, enquanto outros apenas os seus impactos. Os anos 1930, 40 e 50, são ainda lembrados como grandes anos para a Capoeira Angola, posto que essa hegemonia ainda não se dera por completo. O livro de Frederico Abreu, “ O Barracão do Waldemar”, é ao mesmo tempo funcional e comovente, na forma em que descreve o espaço do Bairro da Liberdade, onde o Mestre Waldemar realizava suas rodas no período citado, atuando como espaço de lazer e convergência comunitária.10

É a partir da década de 1970, que o refluxo iniciado em 1930, vai se fazer sentir de forma mais contundente, com a extinção de muitas rodas, muitos mestres se aposentando (da Capoeira), desmotivados pela falta de incentivo e interesse popular pela Capoeira Angola, outros ainda ficando doentes e desassistidos. O Mestre Pastinha é um dos mais representativos da trajetória da Capoeira Angola, que se confunde com a sua própria vida. Nos anos 40 e 1950, sua academia, localizada no sobrado de número 19 na Ladeira do pelourinho, era muito movimentada por muitos alunos, artistas e intelectuais, além de estar incluída nos roteiros turísticos. Toda essa movimentação, no entanto, não foi suficiente para garantir ao Mestre qualquer estabilidade econômica.

Capoeirista, pintor, escritor, filósofo, respeitado entre toda a intelectualidade baiana, frequentemente citado na imprensa local, não possuía meios para acumular para si, proventos advindos da utilização de sua imagem. Seguindo a linha de Márcio de Abreu (2006,p.25), percebemos que o Mestre Pastinha, tanto quanto o Mestre Bimba, o Mestre Waldemar, e muitos outros, foram vítimas de um modelo de mais-valia cultural, posto que possuíam a mão de obra Capoeira, a linguagem adaptativa necessária para transformar a sua arte em “produto cultural”, mas não eram proprietários dos “ meios de produção cultural”, que viabilizariam a absorção própria dos lucros gerados por sua prática. Nos debruçaremos de forma mais detalhada sobre este tema em capítulo posterior, mas o fato é que, fora das luzes do palco/roda, esses mestres eram, essencialmente, homens negros em um sociedade racista, pobres, artífices de uma atividade artística que não lhes propiciava quaisquer dos direitos básicos trabalhistas, como aposentadoria ou pensão.

Em 1967, o Mestre Pastinha, já com sérios problemas de saúde e com um processo de cegueira bastante avançado, viaja com o seu grupo para representar o Brasil no Festival de Artes Negras realizado em Dakar, no Senegal. Tamanha representatividade, não significava nenhuma mudança no seu status social. Em 1971, já cego, o Mestre tem o imóvel onde estava instalada a sua academia, tomado pelo governo do Estado, sob a alegação de que após a sua reforma, o Mestre retornaria. O processo foi acompanhado pela imprensa local até seu desfecho, que culmina com a transformação do espaço em um restaurante de comidas típicas do SENAC, e o Mestre, doente, cego e na miséria, abandonado em um cubículo úmido em um dos inúmeros becos do Pelourinho. Sua morte, em 1981, em um quarto do Asilo São Pedro, com o apoio único de sua última esposa, Dona Romélia, é ilustrativa do momento infeliz vivido pela Capoeira nos anos 1970 e início dos 80, com o fechamento de academias, a doença ou a morte de Mestres e, principalmente, a falta de novos praticantes que pudessem representar a renovação, reprodução e permanência da Angola12. Menos de 10 grupos de Capoeira Angola poderiam ser encontrados em toda a cidade, enquanto que os grupos da Regional eram contados à centenas, em qualquer esquina de qualquer bairro, realizando eventos, formando professores, em programas de TV, em escolas, em clubes. O destino da Capoeira Angola parecia ser o desaparecimento , tornar-se peça de museu, um objeto anacrônico de prática não apropriada para a “moderna modernidade”, “ Coisa de velho” era o que os Mestres mais ouviam, enquanto viam a saúde se esvair e os alunos e admiradores desaparecerem. Ser “angoleiro” era motivo de espanto e de zombaria, um incômodo que teimava em atravancar a ‘evolução’ da Capoeira em seu caminho para ocupar o seu lugar na sociedade brasileira.

O processo que conduz a Capoeira Angola, desde essa fase de ostracismo e quase extinção, até os dias atuais, em que se encontra disseminada em todos os continentes, respeitada e conceituada, gerando emprego e renda ( e pagando INSS), ocupando diversos espaços na sociedade, inclusive com suporte financeiro do Estado Brasileiro para subvencionar as atividades dos “Mestres da Cultura Popular”, é o foco e objeto deste trabalho. Vamos, antes disso, rever um pouco do processo sócio-político brasileiro da segunda metade do século XX, para uma melhor compreensão de como a trajetória capoeirana esteve relacionada com o contexto das variações políticas e ideológicas nacionais, e de que formas os capoeiras se relacionaram, atuaram e intervieram nesses cenário, de modo a influenciarem ou serem influenciados por ele.











Capítulo III
A Capoeira e a sociedade Brasileira




A partir do estudo cronológico da história da Capoeira, proposto no capítulo anterior, pretendemos perceber três momentos históricos diferenciados, no que diz respeito ás relações entre Estado e a sociedade dominante brasileira com a Capoeira:

O primeiro, no período colonial, está inserido no contexto das perseguições generalizadas às manifestações culturais da população escravizada, o que agrega à Capoeira, as danças, batuques e as religiões afras. A perseguição às expressões culturais negras na colônia e no império, são conseqüentes da percepção então corrente, do escravo como rês, como coisa desprovida da integralidade das características humanas, estando, portanto as suas expressões mais aproximadas de demonstrações de bestialidade, imoralidade e barbarismo, do que de qualquer noção civilizada de ‘cultura’. Ainda que houvessem graus e modelos alternados de repressão às expressões culturais negras, a relação sempre se deu no âmbito da repressão e do controle 13.

O segundo momento está compreendido na primeira República, caracterizado como período de criminalização da capoeira e, se inicia com o Código Penal Republicano, de 1890, indo até 1930. Nesse segundo período, somam-se às teorias racistas de Gobineau, uma nova gama de preconceitos etno-sociais constantes no ideário positivista da república14. O Pós-abolição traz a necessidade premente de definirem-se políticas para a integração e controle da população negra liberta, na sociedade brasileira. Nesse contexto, a aproximação entre a medicina e a criminologia na construção de uma teoria de análise social com pretensões cientificistas, vai fundamentar as políticas de controle populacional implementadas pelo estado brasileiro.

Especialmente sob influência da produção acadêmica oriunda das faculdades de medicina de Salvador e Rio de Janeiro das primeiras décadas do Século XX, vão ser implementadas políticas públicas de caráter higienista e eugenista, objetivando os vários níveis de “saneamento social”. Os padrões de organização urbana das capitais européias vão inspirar as reformas urbanistas e as campanhas massivas de saúde nas grandes cidades. Por outro lado, a teoria eugenista inspira as políticas nacionais de imigração, com a importação maciça de trabalhadores europeus para substituir a mão-de-obra escravizada.

Conquanto não houvessem políticas públicas que objetivassem a integração sistemática do ex-escravo na sociedade e no mercado de trabalho, o elemento negro, posto à margem, vai ser arbitrariamente associado às próprias mazelas sociais que o vitimam, a partir da interpretação racial das teorias frenológicas do italiano Cesare Lombroso15, acerca das relações entre tipo físico, comportamento criminoso e insanidade mental. Os escritos do antropólogo maranhense Nina Rodrigues, e sua influência sobre a Gazeta Médica da Bahia, vão estamentar a idéia do negro enquanto tipo humano naturalmente delinqüente e propenso a desvios psiquiátricos, que vão ter ampla aceitação nos meios jurídicos e médico-legais brasileiros, direcionando uma série de medidas e políticas a nível penal e psiquiátrico.

No Rio de Janeiro, são fartos os registros referentes a prisões de capoeiristas por crime específico de Capoeiragem, conforme previsto no artigo 402 do Código penal da República. Muitos desses capoeiras eram conduzidos para colônias correcionais como a de Fernando de Noronha, reservada para essa espécie de crime. Na Bahia, os pesquisadores não puderam encontrar registros de prisões por crime de capoeiragem, sendo recorrente porém, a citação nos registros de prisão da época, por vadiação e brigas de rua, de diversos nomes conhecidos e reconhecidos dentro da capoeiragem baiana. Muitos dos indivíduos constantes nesses autos de prisão por vadiagem, estão presentes nas listas dos capoeiristas “da antiga”, citados, por mestres como Pastinha e Noronha (PIRES, 2005, pp.146-148)

Os anos de perseguição institucional à Capoeira correspondem à quase total extinção da capoeiragem clássica carioca. Alguns autores apontam a Revolta da Vacina, como último episódio da atuação maciça dos Capoeiras do Rio, registrados entre os mais notáveis agitadores (MNU, 1988, p.67). Em Salvador, a prática da Capoeira adquiriu caráter diferenciado, com a incorporação permanente (embora de modo diverso, de acordo com o momento, lugar, ocasião), do uso de instrumentos musicais como suporte rítmico do Jogo. A própria conceituação da Capoeira como “Jogo”, é uma especificidade baiana, uma transmutação da Capoeira arma de combate, para uma Capoeira ritualizada, repleta de comportamentos simbólicos metodicamente exigidos para que a participação do praticante se dê de maneira integral.

A Capoeira baiana se dissemina em rodas, montadas nos bairros populares, principalmente em lavagens e festas, desafiando abertamente a repressão policial, em demonstrações públicas de agilidade e destreza corporal. É ao mesmo tempo, um momento ritual, onde somente determinado grau iniciático garante uma percepção completa, como também uma apresentação pública atraente, que envolve a assistência pela beleza dos movimentos e pela riqueza dos sons.

O terceiro momento, que se inicia com o Estado Novo e se estende por boa parte da 2ª metade do vigésimo século, até fins da ditadura militar, representa um importante momento para a construção ideológica de um projeto de identidade nacional brasileiro. Quando o grupo positivista gaúcho, representado por Getúlio Vargas assume o governo central, traz para o poder uma concepção bastante particular das idéias comnteanas, agregando um projeto de governo centralizador e intervencionista, descrente do programa liberal:

“ ... a autoridade saída do consentimento geral dos povos não passa de uma fórmula grotesca, cuja impotência e incapacidade para a solução dos magnos problemas oferecidos pela civilização hodierna, dia-a-dia vão se firmando na consciência dos homens esclarecidos.(...) Isso de soberania popular, de governo do povo pelo povo, são conceitos vãos, criados para estorvar a ação da autoridade no estudo das questões sociais cuja solução só se deve inspirar na necessidade histórica e na utilidade pública”16


Vargas se dedica com afinco à consolidação de uma “cultura nacional”, bem como do próprio sentimento de nacionalidade através desta identidade cultural nacional. Nesse contexto, as idéias raciais segregacionistas e excludentes sobre negros e indígenas, dão lugar ao discurso do congraçamento das três raças fundadoras, em um país que se orgulha de sua condição de miscigenado, onde as raças se misturam e não existe preconceito racial. O mito da democracia racial inaugurado por Gilberto Freyre em seu Casa-Grande e Senzala17 é incorporado ao discurso oficial do governo Vargas, com negros, brancos e índios, formando o conjunto etno-psico-social do povo brasileiro.

Independente das discrepâncias sócio-econômicas extremas separando empiricamente os diversos componentes étnicos da população brasileira, o discurso ferrenho da igualdade racial, serviu inclusive para vetar qualquer tipo de organização social fundamentada em sua especificidade étnica, como é o caso da Frente Negra Brasileira, proibida por Vargas em 1937 ( MNU,.1988,p.70). Estado Novo, ideologia nova, fazia-se necessário um homem nacional novo, que encarnasse a nova auto-percepção do país.

O eugenismo tem então influência crescente nas políticas sociais do Brasil, com eugenistas renomados ocupando cargos públicos de importância, nas áreas de saúde e serviços. Belisário Pena um dos fundadores da Sociedade Eugenista Brasileira, chega a Ministro de Saúde de Vargas, após ocupar diversos cargos menores. É um eugenismo adaptado, certamente, o que busca reunir as melhores aspectos das raças que compõem a população nacional, para a construção do homem brasileiro. A nossa miscigenação, seria capaz de, processualmente, agregar as qualidades de negros, índios e brancos, principalmente, “depurando as raças inferiores’ de suas vicissitudes atávicas”. Por outro lado, uma estrutura moderna de repressão e isolamento dos indivíduos socialmente desviantes era montada, “vigiando e punindo”, aqueles que não se enquadrassem na nova ordem social (SCHWARCZ, 2002).


No campo da cultura, essa mudança de perspectiva também pôde ser sentida. As expressões culturais negras, até então perseguidas e negadas, vão ser incorporadas enquanto contribuições à cultura brasileira , e mesmo enquanto expressões exemplares de nossa cultura. No entanto, do mesmo modo que na relação eugenista referente à genética , essa integração representava uma depuração dos caracteres étnicos mais arraigados em prol de uma “brasilização” de suas práticas, de seus espaços, de suas linguagens e principalmente, de seus discursos. A religião, o samba, a dança, os folguedos negros passam a ser aceitos, na medida em que deixem de representarem espaços específicos de sua comunidade étnica, para se tornarem componentes do folclore brasileiro, expressões inermes, desprovidas de risco, meros reprodutores de um passado que já não se reputa transformador ou influenciador da realidade, pelo contrário, torna-se veículo reprodutor da ideologia do estado, produto cultural de consumo interno e de exportação, de grande lucratividade para uma indústria cultural incipiente.18

A ditadura militar que se inicia em 1964, após um brevíssimo intercurso democrático, embora represente uma mudança na postura econômica do país, com a economia brasileira sendo aberta para o capital norte-americano, não traz qualquer modificação no que se refere ao “lugar” do negro na sociedade brasileira: mão-de-obra barata e não especializada, sendo o futebol, a música e as artes em geral, as únicas vias de ascensão social e financeira do negro. Qualquer manifestação sócio-cultural negra que representasse alguma contestação coletiva desta comunidade era tida por “contrária ao espírito nacional” racialmente democrático. Conquanto não houvessem mobilizações políticas que demandassem repressão policial coordenada, a repressão psicológica era sempre imediata e unânime, tanto da direita, quanto da esquerda que buscava tomar o poder.

É nesse período que a Capoeira Regional atinge o seu apogeu, alcançando plena aceitação em todos os setores da sociedade, disseminando-se pelo mundo, enquanto a capoeira Angola caminhava a passos certos para a extinção. Obviamente, a percepção oficial de cultura e a política cultural proveniente dessa percepção, não são suficientes para, por si sós, determinar a extinção das expressões culturais que não se enquadram no seu modelo padrão. Contudo, o fato é que as expressões culturais dissonantes, passam a sobreviver de forma bastante marginal à cultura oficial, num claro desafio das culturas populares, às imposições da cultura popular oficial veiculada para as massas pelas mídias.

Esse é o caso do samba da malandragem, do jongo, do Candomblé e da Capoeira Angola, entre outros, que vão se manter forçosamente guetificados, com todo o seu potencial latente testemunhado somente por grupos restritos de adeptos.

A caracterização desses três momentos históricos diferenciados, no que se refere à relação entre o Estado e as elites brasileiras com a cultura negra, nos permite propor um quarto momento, que se inicia em finais dos anos 1970, com o processo de abertura democrática da política brasileira, se estendendo até os dias de hoje, quando essa democracia ainda não plenamente consolidada ( e talvez longe disso, ainda), se enriquece, ao menos, com a abertura de espaços para que sejam expressas e ouvidas as vozes da diversidade.












Capítulo IV

Índios e padres e bichas, negros e mulheres, e adolescentes, fazem um carnaval...



A frase titular deste capítulo, extraída da música “Podres poderes”, gravada por Caetano Veloso em 1984, reflete certo incômodo do autor, quanto ao efervescente cenário nacional dos anos 1980. De fato, a diversidade das vozes sociais que se levantaram por todo o país, poderia realmente soar como cacofonia, para qualquer ouvido acomodado ao silêncio de chumbo dos anos de ditadura militar. Mesmo aqueles representantes de certa intelectualidade brasileira acostumada a ser porta-voz única dos supostos anseios do povo, assistiram com receio o momento em que os diversos setores populares brasileiros buscaram se organizar para expressar suas idéias, suas demandas e seus projetos.

Se este “carnaval” feito pelas assim chamadas “minorias sociais” desagradaram a alguns intelectuais de direita e de esquerda, deve-se provavelmente ao fato destes estarem por demais apegados aos lugares sociais nos quais essas parcelas da população estavam convencionalmente encerradas. No entanto, se atentarmos para Roberto da Matta, veremos que o carnaval é o momento ritual, no qual os papéis sociais são invertidos, colocando os estamentos cotidianos de cabeça pra baixo(DAMATTA, 1997, p.81) o que pode certamente causar certa vertigem para alguns.

Os anos 80, são anos de intensa efervescência. Índios e padres, bichas, negros e mulheres e adolescentes, se organizavam em grupos específicos para, a partir da sistematização das suas experiências coletivas, perceberem as suas demandas comunitárias, traçarem planos de ações para construir soluções e, por meio da pressão popular, exigir dos poderes públicos, as vias para que essas soluções fossem alcançadas. Era época da campanha das Diretas-Já, que reuniam milhões de pessoas nas praças do país, clamando pela abertura democrática. Índios seqüestravam diretores da Funai, os padres “comunistas”, organizavam as periferias nas Comunidades Eclesiais de Base, os homossexuais também formavam seus grupos, e o GGB (Grupo Gay da Bahia), fundado em 1980, é referência nesse sentido. Os movimentos negros que se reuniram em 1978 para formar o MNU, adquiriam cada vez mais força, unindo política e cultura numa fórmula de sucesso, as mulheres se reforçavam nos grupos de Gênero, fosse em organizações específicas ou em núcleos existentes dentro de outras organizações, como no próprio MNU, enquanto os adolescentes também criavam os seus problemas, tanto nos movimentos estudantis, quanto nos bandos de punks, que infestavam as ruas escuras das grandes cidades. O país estava convulso.19

Em Salvador, o ano de 1981, é o ano do memorável quebra-quebra dos ônibus coletivos , contra o aumento das passagens. È ano das grandes invasões de terrenos urbanos, das grandes passeatas contra o desemprego, contra a carestia, pela estruturação dos bairros de periferia, ano de muita violência policial. A sucessão de acontecimentos que transtornavam a cidade, foi suficiente para provocar a demissão do então prefeito Mário Kértez e ocupar por bastante tempo os noticiários nacionais.

Mil novecentos e oitenta e um, foi também o ano da explosão da bomba do Riocentro, escândalo em torno de um fracassado atentado terrorista tramado pelas forças armadas, que culminou com a morte acidental de dois militares. Foi ano de Flamengo campeão mundial em Tóquio.

No dia 13 de novembro de 1981, morre o Mestre Pastinha. Registro videográfico realizado nos últimos dias de sua vida e incluído no documentário “Capoeiragem na Bahia”, mostra um resto de homem. Encolhido no canto da cama, sem dentes, cego, silencioso, fechado em seu mundo. Dia 14 de novembro, os jornais retrataram o enterro pobre, pequeno, sem os artistas e intelectuais que se diziam seus amigos, sem políticos, sem autoridades ou diretores dos órgãos de turismo, nem mesmo os seus alunos se fizeram presentes para segurar as alças do caixão. O Caixão, foi comprado por Dona Romélia, sua última esposa, que, vendeu acarajé, para que o Mestre não fosse enterrado em um caixão de indigente.

Se em 1968, o sociólogo Waldeloir Rego, já percebia em seu ensaio Sócio-etnográfico da Capoeira Angola, um quadro de decadência (REGO,1968,p 202) , o início dos anos 80, marcado pela morte do Mestre Pastinha, representam o fundo do poço, o ponto do não retorno, no qual a Angola, por inércia, tendia a permanecer.











Capítulo V

A revitalização da Capoeira Angola



No presente capítulo, nos utilizamos de informações advindas das entrevistas realizadas durante o período de pesquisa, para dar suporte às investigações referentes ao processo de reversão desse quadro de decadência. Nesse sentido, buscamos situar este processo no contexto sócio político atravessado pelo país na época enfocada, travando um diálogo entre o conteúdo das entrevistas e a contextualização social, política e cultural por nós levantada nos capítulos anteriores, buscando perceber as relações existentes entre os desenvolvimentos internos do grupo da Capoeira Angola, com os desdobramentos externos atravessados então pelo conjunto da sociedade brasileira, no qual a Capoeira e os capoeiristas estão inseridos.

O deslocamento da Capoeira desde o espaço determinado para a cultura popular, até o espaço reservado aos esportes da elite, dá-se devido a uma transformação do seu discurso interno, bem como da linguagem através da qual esta se apresenta externamente. Se entendermos a cultura popular como “aquela produzida pelo povo, para ser consumida por este mesmo povo, de produção anônima, isto é de domínio público e muitas vezes, uma construção coletiva” (DIAS, 1996.p.71), percebemos que a disseminação da Capoeira entre as elites baianas a partir dos anos trinta, é resultante de certa descaracterização representada pelas adaptações efetuadas pelo Mestre Bimba, objetivando, segundo o próprio mestre “ tirar a Capoeira debaixo do pé do boi”. Thompson, entretanto, nos avisa para “ ter cuidado quanto a generalizações como ‘cultura popular’ com uma perspectiva ultraconsensual dessa cultura”(THOMPSON,1998, p17). Para o historiador inglês,

“ longe de exibir a permanência sugerida pela palavra ‘tradição’, o costume era um campo para a mudança e a disputa, uma arena na qual interesses opostos apresentavam reivindicações conflitantes.(...), [esse costume] não se autodefinia, nem era independente de influências externas.(...) Uma cultura é também um conjunto de diferentes recursos em que há sempre uma troca entre o escrito e o oral, o dominante e o dominado, a aldeia e a metrópole...”20.


Para Márcio Abreu,

“ a genialidade do Mestre Bimba, esteve justamente em sua reinterpretação de códigos acadêmicos, lhes dando novos significados e utilizando-os, através da Capoeira, como uma via de transposição de valores.(...)O Mestre Bimba soube aproveitar-se de situações sociais e culturais que lhe permitiram de alguma maneira, atingir resultados práticos, indispensáveis à consolidação do seu projeto de ‘tirar a Capoeira debaixo do pé do boi’ – este entendido como um esforço para que a Capoeira alcançasse uma visibilidade positiva e o reconhecimento social”.21


Se retornarmos à contextualização referente ao cenário político brasileiro na década de 1930, com a implantação do Estado Novo, percebemos que esse processo se estabelece “ através das novas dimensões dadas à ‘indústria do espetáculo e do lazer” ( ARAÚJO, 1992, p.31), em um momento em que uma indústria cultural incipiente, tornava-se importante veículo de construção hegemônica da identidade nacional pretendida pela burguesia. Examinando o processo de disseminação do samba, em processo historicamente e contextualmente próximo ao da Capoeira Regional, Maria de Lourdes Gomes compreende a ascensão musical do samba “intimamente ligada a um novo momento político do país, sendo necessário fazer uma gigantesca síntese de vários padrões e recursos estéticos criados pela mídia para satisfazer o gosto e o desejo dos empresários” (GOMES, 2002, p.28), “ Uma adaptação de seus recursos a um público já propriamente ávido por se identificar como cidadão moderno, moreno, mas industrial, pobre, mas em desenvolvimento...” (Id. 2002.p. 27)

Foi a função desta ‘indústria cultural’ “a adaptação de produtos da alta cultura ou da cultura popular, realizada de forma mecânica, para ser distribuído em larga escala para o consumo das massas”.( DIAS, 1996, p.71)

Nesse contexto, “ tudo o que surge é submetido a um estigma tão profundo que, por fim, nada aparece que já não traga antecipadamente as marcas do jargão sabido e não se demonstre, à primeira vista, aprovado e reconhecido”(ADORNO,2002,pg 18). Importando principalmente a “ capacidade de sujeitar-se minuciosamente às exigências do idioma da simplicidade” (Id. Op. Cit, p.19). Assim, a Capoeira Regional efetivou perfeitamente o depuramento das características raciais mais arraigadas a que nos referimos anteriormente, de modo a adequar seu conteúdo e sua linguagem aos pressupostos ideológicos do momento histórico-político tratado, veiculados e massificados através dos meios de comunicação da época.

É no Estado Novo que a “educação física passa a fazer parte dos currículos escolares, para a tender às necessidades de fortalecer fisicamente o branco, que era débil, assim como, de disciplinar o negro, que era considerado vadio e embrutecido” ( DIAS, 1996, p. 73) A ‘vadiação’, nome utilizado pelos próprios negros para designar a brincadeira descompromissada da Capoeira, passa a representar um paradoxo à moderna padronização da Capoeira desportiva e sistematizada, o que nos manda de volta a Adorno, quando afirma que “ a indústria cultural pode se vangloriar de ter erigido em princípio a transposição – tantas vezes grosseira- da arte para a esfera do consumo, de haver liberado a diversão de sua ingenuidade mais desagradável.” (ADORNO, 2002, p. 28)

Não pretendemos defender uma visão maniqueísta que polarize contrariamente as Capoeiras Regional e Angola, categorizando vilões e heróis, no entanto, as pesquisas nos indicam ter a Regional ocupado o ‘lugar’ previsto para o negro integrado, tendo como base uma perspectiva feryreana de confraternização das raças fundadoras. Enquanto isso, a Angola teria sido depositária dos ‘africanismos anacrônicos’ responsáveis por sua exclusão da modernidade corrente.

Repetindo Thompson em sua reflexão sobre a cultura popular inglesa do século XVIII, e referindo-a à Angola, “ temos assim um paradoxo característico daquele século: uma cultura tradicional que é, ao mesmo tempo, rebelde. A cultura conservadora da plebe quase sempre resiste, em nome do costume, à racionalizações e inovações da economia.” ( THOMPSON, 1998,p. 19) .

“O processo do capitalismo e da conduta não-econômica baseada nos costumes, estão em conflito, um conflito consciente e ativo, como numa resistência aos novos padrões de consumo (necessidades), às inovações técnicas ou à racionalização do trabalho que ameaçam desintegrar os costumes...”22


Na mesma linha de raciocínio, a decadência da Capoeira Angola teria sido determinada por sua não adequação aos ícones metodológicos, estéticos, e comunicacionais pressupostos pela indústria cultural nacional incipiente, em sua busca essencial por consolidar uma identidade nacional ideologizada e burguesa:

“ O negativo desloca-se para a Capoeira Angola, representante das tradições e por isso, dos negros, da vadiagem, dos valentões, das mandingas, das ruas, dos folguedos, dos conflitos sociais, enfim, é a Angola que continuará a ser a ‘arte negra’, elemento da cultura popular. A Capoeira Regional, apresenta-se como moderna, sistematizada, asséptica, eficiente, disciplinadora, uma boa forma de treinamento, apropriada para as academias, um verdadeiro ‘esporte de brancos’, que atende às necessidades do novo homem brasileiro”23.


Sobre essa caracterização da Capoeira Angola como coisa “ da rua’, recorremos outra vez a Roberto da Matta, quando este afirma que em sua sociologia, “ a categoria rua, indica basicamente o mundo, com seus imprevistos, acidentes e paixões, ao passo que casa, remete a um universo controlado, onde as coisas estão nos seus devidos lugares” ( DAMATTA, 1997, p. 90). Se considerarmos a partir de um ponto de vista racial, a determinação do Mestre Bimba em “somente aceitar como alunos pessoas que tivessem ocupação, fossem estudantes ou trabalhadores’ e “ proibir que [ seus alunos] freqüentassem a roda de Angola e de rua, para não se misturarem com possíveis ‘maus elementos’”(D´ANDRADE, 2006, p. 58), podemos perceber quais tipos de “coisas” eram colocadas em quais “lugares”.

A Capoeira Angola, ainda que tenha se utilizado de alguns espaços sociais negociados pelo pioneiro da Capoeira Regional, não se adaptou perfeitamente ao novo formato da Capoeira “produto cultural”, e “quem não se adapta, é massacrado pela impotência econômica, que se prolonga na impotência espiritual do isolado” ( ADORNO, 2002,pp.25-26). Nesse sentido, podemos entender o pesquisador da Capoeira Frede Abreu, quando afirma em entrevista dada para a nossa pesquisa que

“Na medida em que ela [a Capoeira Angola] entra em decadência, somem esses mestres antigos, Waldemar, Cobrinha Verde, eles estão sem condições nem de ensinar nem condições de fazer reproduzir a herança deles, você não tem uma renovação da Capoeira Angola , não é uma coisa jogada mais por jovens, nessa época em que eu entrei na Capoeira, eram pessoas antigas que jogavam a Angola,”.


A sistematização da Capoeira Regional, com a abertura das academias, a nova metodologia de ensino, as graduações, as formaturas, as apresentações, as lutas de ringue, a esportivização, a ligação com a Educação Física, traduziram a Capoeira para uma linguagem acessível às elites, superando (ou possibilitando a superação) dos antigos preconceitos sociais contra a Capoeira, tornando-a produto cultural bem aceito, comercializável e mesmo muito lucrativo. No entanto, ao tornar a Capoeira um produto cultural, o Mestre Bimba não pôde, ele mesmo, tornar-se um “produtor cultural”, ou para melhor definir o sentido que pretendemos dar a esse termo, não pôde tornar-se um “capitalista cultural”, tendo ficado a produção dos grandes eventos, das emissões radiofônicas (e posteriormente as televisivas), a autoria dos livros, a fundação dos grupos internacionais de Capoeira e dos grupos folclóricos, bem como os cargos direcionais das entidades fundadas para reger a Capoeira-esporte, nas mãos dos médicos, advogados, cirurgiões e posteriormente, dos professores de educação física e folcloristas multinacionais, tendo restado ao Mestre Bimba, e a muitos outros mestres negros da Capoeira Regional, o papel de “ prestadores de serviço” cultural, vítimas da mesma trajetória comum aos mestres angoleiros.24

Frede José de Abreu, economista, é um dos principais pesquisadores da Capoeira na atualidade, iniciou suas pesquisas em 1975, envolvido com a nata da Capoeiragem baiana. Participou da organização, em 1980, de um seminário nacional sobre a Capoeira, do qual participaram os Mestres João Grande, João Pequeno, e os mestres Canjiquinha, Cobrinha Verde, e Paulo dos Anjos, então ainda vivos. Trabalhou em diversos projetos sociais referentes à Capoeira, no Liceu de Artes e Ofícios da Bahia, na Fundação Visconde de Mauá, e atualmente no Projeto Mandinga, onde dirige o Instituto Jair Moura, maior acervo internacional de documentos diversos sobre Capoeira. Frede é autor de livros como, Bimba é Bamba, O Barracão do Mestre Waldemar, A Capoeira Baiana no Século XIX, além de dezenas de artigos. Participou da fundação da Academia do Mestre João Pequeno, em 1983, e da re-organização da Academia do Mestre Canjiquinha, na mesma época25.

Para Frede Abreu, ainda sobre a decadência da Capoeira Angola,

“Agente associa isso também ao processo de decadência da Academia do Mestre Pastinha, também coincide ao desaparecimento da roda da Liberdade, do Barracão do Mestre Waldemar, depois da década de sessenta, mas o básico pra se olhar isso é a academia do Mestre Pastinha.(...) A Regional era coisa jogada mais por jovens, da classe média, nessa época, a vitalidade estava mais visível na Capoeira Regional. A Angola, agente tinha a idéia de que ela estava no recolhimento, refratária, não tinha renovação, eram muito poucas pessoas, e era uma coisa restrita à Bahia, depois é que vem essa expansão. (...)Começam a aparecer angoleiros em outras partes do país, e até conversão de caras que eram da Regional ou de outra Capoeira para a Angola.”


Também os outros entrevistados situam o momento crucial da decadência e do ressurgimento da Capoeira Angola no período imediatamente posterior à morte do Mestre Pastinha. Para o Mestre Jogo de Dentro, Jorge Egídio dos Santos, nascido em Alagoinhas, tendo vindo menino para trabalhar em Salvador, formado pelo supracitado Mestre João Pequeno, (aluno do Mestre Pastinha), e que estava dando os seus primeiros passos na Capoeira justamente nessa época,

“ Alguns capoeiristas da época, jovens, criticavam a Capoeira Angola, era coisa de velho, coisa do passado, que não existia mais, que agente estava perdendo tempo.e de certa forma isso nos fortaleceu. E muitos Angoleiros ficaram sem espaço, como esse pessoal mais velho não queria abrir mão, não queria seguir a Capoeira do momento, muitos resolveram ficar afastados, muitos foram pro interior, muitos foram cuidar de suas famílias, porque as pessoas não estavam valorizando.”


O depoimento do Mestre reforça as indicações, de que pesava sobre a Capoeira Angola, o estigma de expressão cultural atrasada, retrógrada, que tendia a desaparecer. Outro mestre entrevistado, o Mestre Valmir, da Federação Internacional de Capoeira Angola, iniciava-se também na mesma época, como aluno do Mestre Moraes, no GCAP. Natural de Salvador, recorda o período em que iniciou-se na Capoeira Angola, quando o isolamento vivenciado pelos artífices da Angola, solidificava-se como fragilidade material:

“O GCAP tinha uma forma de ser dirigida internamente, com comissões, e aí a gente foi a campo, pra ver qual era a situação desses mestres, visitar, saber de suas histórias, agente via o abandono em que essas pessoas estavam, muitas vezes em residências que não tinham estrutura digna para um ser humano, e ao meu ver essa é a decadência de pessoas que tanto deram e tão pouco tiveram como é o caso recente do Mestre Leopoldina.”


O Mestre Moraes, Pedro Moraes Trindade, soteropolitano nascido em 1950, é citado unanimemente pelos demais entrevistados, como personagem fundamental no processo de re-fortalecimento da Capoeira Angola. Ironicamente, foi levado à academia do Mestre Pastinha ainda menino, pelo próprio pai, que sonhava em ter um filho capoeirista. Na década de setenta, Fuzileiro Naval, vai para o Rio de Janeiro cursar a Escola de cabos da Marinha, onde se decepciona com a vida militar:

“Comecei a tomar consciência que a vida militar não era meu lugar, era um paradoxo, eu capoeirista, sendo militar na década de setenta diante daquela situação. Foi quando eu comecei a me envolver mais com a história da Capoeira, com a história sócio- política da Capoeira, aí saí da marinha, fui pra a faculdade estudar. Me formei em letras em 87, atualmente sou mestrando em história Social pela Ufba”



Em 1980, funda o Grupo de Capoeira Angola Pelourinho, retornando a Salvador em 83, transferindo para a Bahia a sede do grupo. É nessa época que se envolve integralmente na missão de resgatar a Capoeira Angola e seus mestres, desde o ostracismo, até o reconhecimento social devido:

“ Eu fui, não gosto nem de falar isso, é muita pretensão, mas eu diria que eu fui um comandante, um general nesse processo , porque quando eu retornei do Rio de Janeiro pra Salvador, em 1983, a Capoeira Angola estava em total decadência na Bahia. Eu vi o Mestre João Pequeno, ensinando Capoeira aqui no Forte, eu vi o Mestre Virgílio, ensinado Capoeira na Fazenda Grande, o Mestre Paulo dos Anjos, mais ou menos por aí. Mas mesmo esses mestres, estavam desacreditados neles mesmos , enquanto praticantes de Capoeira Angola, e adotando identidades que não era deles, e eu resolvi lutar contra isso, chamar a atenção deles para o valor que eles tinham nesse processo de preservação da Capoeira Angola, pelo menos até aquele momento, e que eles não deveriam recuar, que deveriam continuar na luta para que a Capoeira Angola voltasse a ter a força que ela sempre teve antes na Bahia, e que inclusive motivou a criação de um outro estilo de Capoeira, que é a Capoeira Regional. (...)E consegui aglutinar aqui dentro no Forte26, no nosso espaço antigo , a maioria desse Mestres de Capoeira, que já estavam no ostracismo, Mestre Waldemar, Mestre Bobó, e muitos outros .Eu tenho isso documentado essa coisa desses Mestres que voltaram para a Capoeira. Mestre João Grande, por exemplo, que nesse momento já não estava praticando Capoeira e nem ensinando, eu trouxe ele de volta para a Capoeira. (...)Lutei briguei, dei muito a cara a tapa por tudo isso.”


O trabalho do Mestre Moraes no Forte de Santo Antônio vai ser fundamental para o resgate da Capoeira angola, seja por servir como incentivo para que os velhos mestres voltassem a sentir-se valorizados pelos seus conhecimentos referentes à Capoeira, como pelo efeito repercutido nos novos estudantes de Angola, que então iniciavam-se em sua prática, como podemos perceber no depoimento do Mestre Jogo de Dentro:

“ O Mestre João Pequeno, o Mestre Moraes, o Mestre Curió, o Mestre Canjiquinha, o Mestre Paulo dos Anjos todos eles tiveram um papel muito importante pra que a Capoeira Angola não desaparecesse, mas dentro desses mestres todos, na década de oitenta, o Mestre Moraes, pela visão que ele teve de chamar todos esses mestres, muitos já fora de atividade, e ele chamou pra os eventos aqui no Forte, onde ele reunia muitos Mestres, Papo Amarelo, Grandão, Paulo dos Anjos, vários, João Grande, Curió, todo esse pessoal tava lá. (...) Eu acho que esses eventos mostraram que tinha uma força muito grande ali, que só era ter oportunidade e daí que veio o incentivo a essa nova geração, que é a minha, que se dedicou a treinar mais, a valorizar mais, pra manter a Capoeira Angola.”


A partir de então, mesmo que sem nenhum caráter associativo ou federativo característico de por exemplo, uma entidade sindical, o processo de resgate da Capoeira Angola vai se disseminando como um movimento, quando os Mestres passam a falar sobre suas experiências enquanto Capoeiristas e os jovens capoeiristas vão repercutindo a absorção desse conhecimento em suas trajetórias. Nesse ponto, sugerimos que, dentro da percepção Thompsoniana referente às classes sociais, aplicando-as ao cenário cultural baiano dos oitenta:

“ A classe acontece quando alguns homens como resultado de experiências comuns ( herdadas ou partilhadas), sentem e articulam a identidade de seus interesses entre si, e contra outros homens cujos interesses diferem ou se opõem aos seus.(...) A consciência de classe é a forma como essas experiências são tratadas em termos culturais: encarnadas em tradições, sistemas de valores e formas institucionais.”27


E outro ponto do depoimento de Frede Abreu reforça essa proposição:

“ Renê, na época tinha uma coluna na Bahia, no Jornal A Tarde, e o René batia muito forte na Capoeira Regional e isso dava uma certa visibilidade à Angola.(...) A verbalização do discurso da Angola, e nisso o Moraes é fundamental, a Janja, a Paulinha, são pessoas que são universitários, você já tem um discurso acadêmico sobre a Capoeira, e eles respondem muito bem a isso. (...)O próprio acirramento da discussão entre Angola e Regional, o angoleiro consegue reverter o discurso favorável a ele, de certa forma ela passa a ser a Capoeira politicamente correta, que a Capoeira Regional era coisa de branco, descaracterização, vem esse discurso da pureza, a volta da discussão das origens novamente se remetendo a África como elemento que está ligado às raízes da Angola.”


Nesse período, percebe-se uma apropriação, por parte dos angoleiros, de um aparato instrumental que é próprio também, da indústria cultural, da linguagem e do formato necessário para traduzir o conteúdo da Capoeira Angola para um público mais amplo, tornando-o também produto passível de negociação intersocial. No entanto, novos fatores são importantes de ser fixados para uma maior apreensão do processo: primeiro, o fato de essa linguagem, bem como os espaços e produtos da reprodução discursiva e mesmo da reprodução material do conteúdo Capoeira Angola, como palestras, eventos, Cds, DVDs, apresentações, projetos de captação de recursos, entre outras coisas, estarem basicamente sob o controle dos próprios angoleiros, que aliaram o papel de mestres da cultura, ao de produtores culturais, no sentido novamente, de serem eles mesmos os capitalizadores dos recursos provenientes de sua prática ( e isso independente do montante ). Segundo, que esse processo está inserido no contexto de empoderamento da comunidade negra no Brasil, quando o negro passa a disputar acesso em áreas antes restringidas, a partir do final da década de setenta, que coincide com o momento de abertura democrática da política nacional, quando uma ampla gama de discursos, práticas e comportamentos passam a obter e exigir espaços sociais. Coincide ainda com um momento de grande crescimento econômico da Bahia, com a criação do Pólo Petroquímico de Salvador e do Centro Industrial de Aratu, que abrem muitos postos de trabalho e geração de renda para essa comunidade negra em processo de empoderamento político. E o depoimento do pesquisador Frede Abreu traz mais indicativos dessa contextualização:

“O movimento da Angola, também é tocado pela classe média, mas com a participação muito grande de uma classe média negra, e na época da Regional a elite negra não estava muito aí para a Capoeira, ela queria mais era se livrar dessa tradição, ou pelo menos manter ela escondida, você vê algumas poucas pessoas, como o Abdias do Nascimento, que pensavam diferente.(...) A Capoeira Angola vem também em um momento econômico diferente, no qual a Capoeira já está estabelecida, você já tem um comércio dentro dela, o processo das academias já funciona, já é normal você cobrar uma aula de Capoeira, natural, então ela responde favoravelmente a esse processo de modernização da Capoeira quando se achava que ela não teria condição de responder, que ela se acabaria, que esses ritos que são tradicionais da Capoeira Angola, os discursos, seus elementos, não seriam compatíveis com a modernidade.”


O Mestre Valmir atesta em relação ao seu grupo:

“O registro acontece logo depois[da fundação do grupo-FICA], pois hoje em dia pra você como instituição estar dentro do sistema, pra você ter acesso a determinadas coisas que começam a surgir, você precisa estar registrado, ter seu estatuto, ser reconhecido na prefeitura , pra fazer um projeto, fazer um evento, fazer uma parceria.”


O resgate da capoeira Angola é conduzido pelos próprios angoleiros, diz o Mestre Moraes:

“ No caso da Capoeira Angola, ela fez isso [a revitalização] no peito, com a força de sua ancestralidade, da sua religiosidade e a Capoeira Regional teve todo o suporte do poder, do Estado, e você pode ver que até hoje a Regional está nas escolas de primeiro e segundo grau, nas universidades e a Angola até hoje não.”



A movimentação negra que se organizava no país, também repercutiu no movimento de revitalização da Angola, assim como os movimentos feministas, entre outros, que trocaram influências com o mundo da Capoeira. Em seus documentos para a formação de quadros, de (MNU, 1988, p.54) o MNU28 já citava a Capoeira como luta de resistência negra, e tinha no resgate das expressões culturais negras, importante vetor organizacional, de que são exemplos os blocos afro. Embora os Mestres entrevistados não se declarem como participantes do Movimento Negro institucional, são unânimes em afirmar a influência ( e mesmo a participação, enquanto apoiadores), das mobilizações raciais dos anos 80 e 90. Frede Abreu, ainda que reforce a importância dos movimentos internos da Capoeira Angola no processo estudado, considera grande a influência das lutas raciais no movimento de resgate da Angola:

“O movimento negro dá o discurso, na revitalização da Angola, principalmente se você considerar o GCAP que é uma instituição forte nesse processo de revitalização da Angola, até hoje ele faz esse discurso, não só ele como a FICA a n´Zinga, Boca do Rio, qualquer evento que você vai deles, esse discurso é bem claro. O Curió já fazia isso, o João Pequeno tinha o negócio assim: ‘não é a questão do negro com a Capoeira, é questão do branco com a Capoeira’. (...)Vem vários discursos cruzados, mas esse do movimento negro é bem expressivo. Todas as festas, efemérides ligadas a movimento negro, o GCAP estava presente, tinha esse interesse de mostrar que Capoeira é isso, teria uma função política quase que essencialista, o próprio movimento negro, se você olhar, quase que não faz referência ao Bimba, é só o Mestre Pastinha, Capoeira Angola”


O Próprio Mestre Moraes declara que:

“ Nos não desvinculamos a Capoeira da ligação racial, ancestral, e essa ancestralidade da Capoeira é africana, e isso me leva a tentar explicar para os meus alunos o significado dessa gama de elementos que estão hoje na Capoeira Angola, vertentes da Capoeira como filosofia, como história, como religiosidade, eu só vejo essas vertentes como sendo de matriz africana.(...) Eu tenho consciência do espaço que eu ocupo enquanto afrodescendente, e oriento meus alunos tanto na Capoeira quanto na escola, sobre como eles devem ocupar os seus espaços na sociedade, mas eu vejo um carnavalização em alguns setores do movimento negro, sem generalizar. Eu leio muito os autores negros norte-americanos, sou fã incondicional no Brasil de Abdias do Nascimento e nos Estados Unidos de Malcom X, entendo a postura de Luther King, mas prefiro estar ao Lado de Malcom X*, a liberdade do povo negro não vai ser conseguida com conversa.”


Essa postura é continuada pelos jovens Mestres da Angola, seja o Mestre Valmir, que embora desligado do GCAP, tenha iniciado sua trajetória enquanto aluno do Mestre Moraes:

“Desde o início, agente trabalha com palestras, onde agente discute temas diversos. A coisa não fica somente em ginga, negativa e toque de berimbau. Essa relação com parceiros que vêm na FICA e que vêem a Capoeira Angola como um movimento de resistência do povo africano, e agente fala da nossa história, de como nós chegamos aqui no Brasil, o caminho que trilhamos enquanto instrumento de resistência. (...) Essa preocupação vem desde o início do grupo e certamente porque agente vem de uma escola, o Gcap, que sempre teve essa prática.”


Também o Mestre Jogo de Dentro oriundo da academia do Mestre João Pequeno cita que, na sua opinião:

“ A Capoeira Angola ela vem do negro, vem da periferia ela vem de pessoas que sempre foram perseguidas pela sociedade e você tem de perceber que todo esse processo é de sofrimento e muitos estão praticando a Capoeira só pelos movimentos”


Se nos Estados Unidos, a febre do Rock n´ Roll levou muito dos jovens brancos americanos, a encontrar o jazz e o blues, na busca pelas raízes do rock, a Capoeira Angola também contou com a procura crescente de muitos praticantes não ortodoxo da Capoeira Regional, em busca de conhecer melhor aquela Capoeira que era tida como Capoeira-Mãe, e que como cita a Mestra Janja “na faculdade nos diziam não mais existir29”. Nesse sentido, os Mestres antigos, bem como os jovens Mestres da Angola, passaram a ser freqüentemente convidados para realizar oficinas e palestras nos eventos da Regional, “ Você não faz evento hoje, de Angola ou Regional, que não se leve um angoleiro”, diz Frederico Abreu.

A Capoeira Angola passou a representar fonte de renda para muitos Mestres. A partir dos anos noventa, alguns Mestres se fixam no exterior (como é o caso do Mestre João Grande, que resgatado pelo Mestre Moraes do posto de gasolina onde trabalhava, fixou residência em Nova York em 1994, tendo posteriormente recebido o título de Doutor Honoris Causa pela universidade de Upsaala, e sido recebido mais de uma vez na Casa Branca) e outros que embora continuem no Brasil fazem viagens freqüentes para visitar núcleos dos seus grupos espalhados no exterior. O GCAP, do Mestre Moraes, tem sede em três estados Brasileiros e no Japão, o grupo Semente do Jogo de Angola, do Mestre Jogo de Dentro, tem filiais em quatro cidades brasileiras, além de sedes no Canadá e na Itália, A Federação Internacional de Capoeira Angola, coordenada pelo Mestre Cobra Mansa e pelo Mestre Valmir, tem sede em quatro estados brasileiros, em onze estados norte-americanos, duas sedes na França, além de sedes no México e no Japão. Os três Mestres entrevistados, realizam regularmente encontros em que reúnem capoeiristas de todo o mundo bem como de participantes dos núcleos internacionais de seus grupos. Do mesmo modo, os três grupos tem Dvds e Cds lançados no mercado, tendo sido o Gcap, do Mestre Moraes , o primeiro grupo de Capoeira do mundo a disputar o Grammy, na categoria World Music, em 2004. em outro vetor, os grupos estão também envolvidos em projetos sociais destinados à formação de cidadania em comunidades carentes através da Capoeira.

O Mestre Jogo de Dentro e o Mestre Valmir, vivem da Capoeira Angola, (e vivem para a Capoeira Angola), a partir de recursos gerados pela venda de instrumentos musicais, de aulas, palestras, oficinas, Cd´s, Dvds, entre outras coisas. O Mestre Moraes, tem uma opinião crítica sobre essa relação, “Eu sou radicalmente contra o Mestre que decide sobreviver de Capoeira, porque ele fica refém de aluno e das pessoas que convidam ele para eventos.” No entanto, é constatável o fato de que a simples possibilidade de que alguns Mestres tirem o seu sustento da Capoeira Angola, representa uma nova conjuntura, onde o conhecimento do Mestre Angoleiro é moeda de troca e via de ascensão social de pessoas que de outro modo, talvez não reunissem instrumentos para realizar essa ascensão, como expõe o Mestre Jogo de Dentro:

“Foi a Capoeira Angola que me deu oportunidade de descobrir esses valores, toda essa história, do sofrimento, da maldade eu descobri através da Capoeira Angola.(...) Hoje muita gente da sociedade me respeita porque não tem como não respeitar, mas antigamente, como negro, com o cabelo Rastafari, era difícil e hoje eles são obrigados a vir apertar minha mão. (...)Eu consegui sair de uma situação que poucos conseguem sair, mudei a história, mas sem passar por cima daquilo que eu acredito, da minha história, e isso é importante.”


O Mestre Valmir, ainda comenta o impacto social positivo que essa ascensão social via Capoeira Angola pode ter, a nível comunitário:

“É outro tipo de referência e ele [ o jovem da comunidade] pode ver um educador, uma pessoa que deu certo, uma pessoa que viaja, que mantém sua família através da cultura, que consegue, mesmo morando na comunidade, melhorar seu padrão de vida.”


Esses Mestres e grupos, foram escolhidos para a nossa pesquisa, devido à sua representatividade no processo estudado, no caso do Mestre Moraes, e pela posição de refletores e continuadores diretos do início da revitalização da Capoeira Angola, também pioneiros em um processo realmente muito novo, que é o da expansão internacional da Capoeira Angola no caso dos Mestres Jogo de Dentro e Valmir. Entretanto, muitos outros Mestres de Capoeira Angola poderiam estar sendo citados tanto para exemplificar a reestruturação da Angola em território nacional, quanto pelo fato de seus grupos possuírem sedes em outros países e continentes. Evidentemente, a Angola não alcançou, e talvez nem pretenda, o mesmo patamar de expansão e resposta econômica da Regional, ainda que tenha conseguido construir pequenas estruturas de auto-reprodução ( discursiva e material) e disseminação, geração de renda, e em muitos casos, de emprego. Mesmo a atual conjuntura internacional da Capoeira Angola, é vista com preocupação pelos Mestres entrevistados, entre os quais citamos o Mestre Moraes:

“Eu não considero como crescimento isso que está aí, pra mim é um inchamento.(...)O boom que aconteceu da Capoeira Angola, um tempo depois da Regional. (...) As pessoas não conheciam a Capoeira Angola fora do Brasil, começaram a se interessar por ela, e a Capoeira se tornou um passaporte e as pessoas, sem generalizar, saíram do Brasil pra ensinar a Capoeira Angola, sem um mínimo de conhecimento, e eu afirmo que a grande maioria não tem esse conhecimento. Eu falo isso, eu estou falando de uma Capoeira Angola dotada de elementos subjetivos. (...) Mas eu queria é que o mestre de Capoeira tivesse a condição de verbalizar o sentimento da nossa cultura, a Capoeira Angola, para pessoas de outras culturas, eu tenho ido para vários lugares do mundo e o que eu tenho visto, é uma limitação muito grande, dos Mestres de Capoeira. Eu falo isso relacionando ao título, você se voltando para as culturas orientais, um Mestre estrapola a prática, e é isso que eu cobro dos Mestres, que eles estrapolem a prática, que ele tenha condição de jogar Capoeira fora da roda.”.


Nesse sentido, nos parece que ainda há muito a ser conquistado pela Capoeira Angola, para que o seu processo de globalização se dê tendo como base a qualidade e não a quantidade, como é a preocupação expressa pelos mestres. O governo brasileiro tem, desde 2006, lançado editais públicos de financiamento para projetos relacionados à capoeira ( não determinando estilo de Capoeira), bem como Editais de reconhecimento oficial aos Mestres das culturas populares, que terminaram por contemplar alguns Mestres de Capoeira Angola30. È novamente o Mestre Moraes, que vai apresentar uma visão crítica, que busca perceber além das aparências:

“ Eu não acredito que seja fácil uma relação harmônica entre o Estado e a Capoeira porque quando isso acontecer, a Capoeira vai ter deixado de ser Capoeira. Eu fico com o pé atrás quando o Estado, quer apoiar a Capoeira. O que foi que houve para um estado que sempre foi inimigo da Capoeira, e a Capoeira também sempre inimiga do Estado, querer apoiar a Capoeira? Eu temo pela cooptação, que os capoeiristas já tenha sido cooptados o bastante, para que o Estado já não tenha medo da Capoeira.eu não acredito na possibilidade de uma relação não conflituosa entre o Estado e a Capoeira”.


O Mestre Curió, dirigindo a Associação para o Desenvolvimento Sócio-Cultural do Capuêra Angola (ADESCCA), vem se destacando, na reivindicação dos direitos dos angoleiros, mobilizando capoeiristas e políticos contra as investidas dos conselhos de educação física que se arvoram no direito de fiscalizar a prática da Capoeira, entre outras atividades físicas. Cobrando do governo medidas como a aposentadoria do velho mestre de capoeira. Além disso, lutando pela cessão de passaporte especial para os Mestres, que são verdadeiros embaixadores culturais do Brasil, promovendo a cultura nacional em todo o mundo, gerando renda através do turismo. Isso demonstra que os Angoleiros, cada vez mais estão buscando organizar-se em torno de demandas comuns, articulando-se a partir das experiências coletivas, buscando não deixar reproduzir-se um passado, onde era comum a morte na miséria dos Mestres Angoleiros.

Nas palavras do próprio Mestre Curió, nos seus mais de sessenta anos dedicados à Capoeira: “ Nosso Senhor é do Bom Fim, o bom começo fazemos nós!”






























CONCLUSÃO



Expressão pertencente ao arcabouço cultural da população africana e descendente de africanos no Brasil, a capoeira, manifestação própria do povo negro, integrado à sociedade brasileira enquanto escravo( e portanto portador de status social negativamente diferenciado), esteve sempre sujeita a uma relação de ‘negociação e conflito’, com essa sociedade na qual se insere. Negada e perseguida enquanto tradição rebelde do povo escravo, representou grande incômodo para as classes dominantes dos centros urbanos coloniais e do Império, sempre tratada e vista como objeto de repressão, ainda que tenha sido por muitas vezes, utilizada politicamente eu uma relação de capangagem.

Mesmo após a abolição da escravidão e a proclamação da república, o elemento negro brasileiro permaneceu marginalizado e socialmente inferiorizado, sujeito a controle do Estado e objeto de acirradas discussões acadêmicas e políticas a respeito de modelos ideais para que se desse a sua integração nacional efetiva. Criminalizada no Código Penal de 1890, a Capoeira praticamente se extinguiu no Rio de Janeiro, em decorrência da forte repressão policial sofrida durante a 1ª República.

O mesmo período, na Bahia, é marcado pela consolidação do processo de ritualização da prática da Capoeira, característica singular da capoeiragem baiana, que vai diferenciá-la das demais e ser, possivelmente, fator responsável por sua sobrevivência e disseminação em outros estados.

Com a criação da Regional,em 1930, a capoeira entra no Estado Novo, iniciando um processo de renovação e adaptação, através da inserção em sua prática, de golpes de outras lutas, bem como de metodologias e perspectivas desportivas provenientes de outras artes marciais, o que vai possibilitar a superação progressiva de preconceitos raciais e classistas contra a sua prática, tornando-a em manifestação cultural e esportiva aceita pelas elites baianas e nacionais.

Em caminho inverso ao da Regional, que nessa época vivenciou franca expansão apoiada no discurso oficial de confraternização das raças formadoras do Brasil, e em uma perspectiva do esporte e da educação física enquanto formadores de cidadania e civismo, a Capoeira Angola vivencia uma progressiva desestruturação e decadência, que tem sua culminância com a morte do Mestre Pastinha, a extinção da maioria das rodas e o afastamento de mestres e praticantes.

A Capoeira angola não se adapta às formatações conduzidas pela capoeira Regional, que lhe possibilitaram tornar-se em produto cultural comercializável, assimilado pelas elites e veiculado pela mídia. A Angola é caracterizada então, como depositária das referências africanas e negras na capoeira, destoante do processo de afirmação da brasilidade e da identidade nacional miscigenada apregoada pelo Estado Novo e continuado pelo Golpe Militar de 1964. Essa não-adaptação vai corresponder ao seu isolamento e à não reprodução de sua prática, exemplificada pela falta de alunos jovens que pudessem continuá-la.

Após a morte do Mestre Pastinha, em 1981, poucas são os grupos e academias que representam a permanência da Capoeira Angola, caracterizando mais, casos de resistência sócio-cultural, do que exemplificando uma possível vitalidade e renovação. São os casos dos Mestres João pequeno e Curió, que mantinham os seus trabalhos na época.

Com a vinda do grupo de Capoeira Angola Pelourinho, ( GECAP), em 1983, inicia-se uma fase de mobilização e auto-afirmação da Angola, tendo como principal organizador o Mestre Moraes, diretor do GECAP, que desde então, passou a realizar eventos de Capoeira freqüentes, tendo como metas, resgatar do ostracismo e do isolamento os velhos mestres da Angola, promovendo a valorização de seus conhecimentos e de suas vivências, além de buscar a valorização da capoeira Angola como um todo.

Inserida no contexto do dinâmico quadro social dos anos 1980, nos quais diversos setores populares e de classe média tentavam se mobilizar para melhor organizar de forma autônoma as suas demandas específicas, essa movimentação dos angoleiros tem no discurso da resistência política e social étnica negra, sua principal referência, estando a quase totalidade de suas manifestações a partir de então, embebidas desse discurso, quando não objetivamente militantes.

O processo de mobilização e valorização da Capoeira Angola promovido pelo GECAP, é citado pelos mestres Jogo de Dentro e Valmir Damasceno, além de pelo pesquisador e autor Frede Abreu, como tendo sido importante marco catalisador e incentivador, para que se formasse uma nova geração de praticantes de Capoeira Angola, incorporados na percepção positiva desta e na necessidade de seu resgate e preservação qualificada.

A partir do final dos anos 1980, inicia-se o processo de mundialização da Capoeira Angola, com a ida de alguns mestres para o exterior e a abertura, nesses países, de filiais dos grupos brasileiros. Nesse momento, evidencia-se a apropriação, por parte da Angola – enquanto conjunto de grupos- de uma série de linguagens e mecanismos comerciais próprios da indústria cultural, que possibilitam uma maior assimilação dos seus conteúdos, práticas e rituais, como livros, cd´s, dvd´s, palestras e eventos de cunho didático e integrador, que facilitam a disseminação desta Capoeira por indivíduos leigos e provenientes de outras culturas.

A Capoeira Angola está apta para ser consumida, por um público cada vez mais apto para consumi-la.

Entretanto, estando o processo de revitalização da angola, sintonizado com o processo de empoderamento social, político e econômico da comunidade negra brasileira, este tem se dado então, de modo a possibilitar a sua gerência e coordenação, por parte de indivíduos oriundos desta comunidade, a partir de pequenas estruturas organizacionais juridicamente fundamentadas, que têm podido garantir o controle comercial das atividades de produção cultural e dos produtos daí resultantes. Além disso, o controle da própria reprodução capoeirística, em se tratando de aulas, fabricação de instrumentos, lançamentos de livros, teses, apresentação de palestras, e principalmente, em se tratando do estabelecimento de suas significações morais, éticas, filosóficas e estéticas.

De todo modo, diversos inconvenientes quanto a esse crescimento mundial da Capoeira Angola, podem ser citados pelos seus mestres, como o surgimento de “mestres” auto-intitulados, incapazes de apreender a integralidade subjetiva da Angola, a violência resultante de disputa de prestígio, e mesmo a relação da Capoeira com o Estado, é vista com desconfiança por alguns mestres. Contudo, diversos níveis de parcerias entre as entidades da Capoeira Angola e os poderes públicos municipais, estaduais e federais, têm sido estabelecidos e tido importante papel para a preservação e disseminação qualificada da Angola.

Por outro lado, a busca por institucionalização e organização dos grupos de Angola, tem sido crescente, objetivando o maior controle e poder de diálogo dessas relações, além de cobrar investimentos públicos, a ação dos políticos, autonomia diante das tentativas de ingerência por parte das entidades reguladoras da Educação Física, e mesmo, direitos trabalhistas para os capoeiristas.

Com o presente trabalho, esperamos estar contribuindo para um estudo multifocado da História do Brasil, que valorize a percepção da cultura enquanto prisma para a observação das várias ‘cores’ e perspectivas que compõem essa história conflituosa, diversa, dinâmica e viva. Nesse sentido, acreditamos no papel do historiador enquanto investigador e partícipe da sociedade que estuda e transforma, citando o Mestre jogo de Dentro no que diz respeito a mudar a história, “mas sem passar por cima daquilo que eu acredito, da minha história, e isso é importante.”

Fontes
Orais:
Frederico José de Abreu ( Frede Abreu) Economista e pesquisador da Capoeira

Entrevista em Outubro de 2007 . 37 min, 57 seg


Jorge Egídio dos Santos (Mestre Jogo de Dentro)Mestre de Capoeira

Entrevista em novembro de 2007. 39 min, 30 seg


Valmir Damasceno ( Mestre Valmir)

Entrevista em Novembro de 2007. 39 min, 10 seg


Pedro Moraes Trindade ( Mestre Moraes) Professor de Inglês, mestrando em História pela Ufba. Entrevista em novembro de 2007, 57 min , 08 seg

Jornalísticas
Acervo do Centro Cultural Quilombo Cecília

Jornal da Bahia, de 22/10/71, “ Pastinha, Tradição da Bahia em apuros’ ( Recorte sem indicação de número de página)

Jornal A Tarde, de 14/11/1981, “ Pastinha morre no abandono” ( Chamada de Capa)

Jornal Tribuna da Bahia, de 14/11/1981, “ Mestre Pastinha morre aos 92, como indigente”, Pág 06

Jornal Tribuna da Bahia, de 14/11/1981, “ Mestre Pastinha pede ajuda ( mas foi tarde demais)”, Pág 06

Jornal Correio da Bahia de 14/11/1981, “Morre Pastinha, um símbolo da cultura baiana ( recorte sem indicação de Número de página)

Jornal da Bahia, de 17/11/1981, “ A capoeira também perde a sua academia”, Pág 02

Jornal da Bahia, de 15/12/1981 “Missa de 30o dia pela morte de Mestre Pastinha”, pág 02

Revista Iê Capoeira, São Paulo: Empório Editorial, 1999, Número 05

Revista Praticando Capoeira, São Paulo: D+T, 2001, Número 16

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8 comentários:

  1. Nossa amei mande-me mais sou mais uma pessoa em busca de esclarecimento e cultura...argolafree@hotmail.com.parabene

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  2. Olá, Colega, ainda não li, mas prometo que vou fazer e deixar minhas impressões.

    Abraços, aguarde que irei fazer isso logo.

    enquanto isso veja meu simples blog.

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  3. Salve irmão gostei, sou professor de Educação Física e capoeirista, eu jogava regional, porém sempre tive vontade de jogar angola. Vou tentar falar sobre a Capoeira de Angola na escola, tem como me ajudar?? rs*
    visite meu blog?: www.arteesporteclube.wordpress.com

    meu e-mail: prodavi@hotmail.com

    Axé

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  4. Fabio.... Parabens! pela tua pesquisa. E, como estamos gingando nas rodas virtuais e outros foruns sobre assuntos que tem a ver com o que vc descreve e historia, etc, mandei uma chamada pra 7 mares pra que outros possam vir ate aqui ver teu trabalho e gingar opiniao, etc.
    Volta do mundo.... Axe'!

    Mestre Jeronimo - 'Iconoclast JC'
    www.myspace.com/mestrejeronimo

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  5. ----------------
    Em 18/04/12, Mestre J C escreveu:

    Axe'! pra Roda,

    Fabio.... olha a volta, na historia, do que somos... Capueragem. Entao, concluimos ^ ^ que da mesma forma que vc identifica o sentido da Capoeira angola desaparecendo se nao fosse por Bimba e sua renovacao de Luta Bahiana, ou, Capoeira regional, a revitalizacao da cultura e da arte da Capoeira, em geral no Brasil, teria ido pra lata do lixo como o feitor sempre quiz que fosse. Capueragem desaparecendo do mapa. --- e' isso ??? --- .

    Entao, pra historia ter sentido, Ordem & Progresso, as duas disciplinas capueristicas de Bimba e Pastinha, angola X regional, de fato nao resistiram aa "modernidade" --- ao contrario do que vc identifica nas palavras e atitude dos mestres que fez referencias, Moraes, J. pequeno, Rene, outros.

    Pra sobreviver e se renovar a Capoeira Angola e Regional teve que se modernizar, correto?
    >> Mestres como o próprio M,.Moraes, M Renê, M. João pequeno, entre
    outros, a Angola resistiu, sobreviveu ao discurso da modernidade, e
    voltou a crescer. >>
    ?????
    Vamos evitar a CON-tradicao que produz demagogia e corrupcao; contra a EDUCACAO. Pois, da maneira que vc historia, pra confirmar a renovacao dos estilos desportistas da regional e angola, podemos tb dizer que ambos estavam em decadencia, em epocas distintas --- 1930 e 1980 --- ? ---- E nao gingaram resistindo contra a modernizacao, mas se modernizaram!

    --- Como provam vc/s que o que foi 'renovado' pra Angola e pra Regional nao foi modernizado??? ---

    Afinal, as duas disciplinas a partir de discurso de seus mestres mentores, Bimba e Pastinha, graduou num desporto, correto?! Os dois mestres se identificavam como desportistas. Mas, seus mestres e mentores, fossem africanos, como falam alguns, ou sendo brasileiros, nao eram desportistas.
    ----------
    Portanto, o processo de revitalizacao que vc mencionou da historia da Capoeira Angola deve ser revisto da mesma forma que sugeri ao Prof. Pelicano, outros, que revisem a sua atitude no tocante a referenciar o sentido do "descobrimento" do Brasil quando promovem a sua historia da Capueragem, da nossa cultura brasileira.
    ------------
    Pra provar mais ainda o que identifico da falta de sentido do que vc falou que foi falado a vc pelos mestres, etc., basta assumir o fato de que o machismo na capueragem tomou outro sentido, de fato, se modernizando, O Jongo, como a Capuera, teve que se modernizar pra poder sobreviver e fazer parte do que somos. A discriminacao (tradicao de angoleiro?) das mulheres, nas Rodas, como faziam nao acontece mais 100% ---- apesar destas ainda levarem cabecadas na cara no dia Internacional da Mulher, como tivemos ha pouco no evento publico em Taubate pelo Mestre Cesar na presenca de outros mestres e o povo --- e torna esse discurso que vc fez da capuera angola nao se modernizar um fato historico sem valor educacional e contradicao.
    ---------------
    Sugiro uma revisao urgente, nessa fala, na historia do que falam sem sentido do que somos na capueragem, entre outros "500" que temos que reciclar pra poder se educar e evoluir.
    --------
    Ieee! --- da volta ao mundo.
    --------
    Mestre Jeronimo - 'Iconoclast JC'

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  6. From: "Fabio Oliveira Nascimento" -----
    Sent: Thursday, April 19, 2012 12:10 AM -----

    Salve Mestre,

    Posiciono os anos oitenta, após a morte do Mestre Pastinha, posi é o momento em que a Capoeira Angola chegou ao ponto máximo do
    ostracismo. Em entrevistas, o Mestre Jogo de Dentro, afirma que nessa época, quem treinava Capoeira Angola era ridicularizado, e que as
    pessoas o atacavam dizendo que aquilo era coisa de velho e que aquela Capoeira não iria pra lugar nenhum, iria desaparecer. O Mestre Moraes,
    também em entrevista feita por mim, quando eu o perguntei o que caracteriza a decadência da Capoeira Angola nesse momento, colocou que
    seria justamente o fato da Angola não estar se renovando. Você tinha os Mestres Antigos e seus discípulos, mas você não tinha uma busca da
    juventude ou de novos adeptos que buscassem conhecer/praticar a Capoeira Angola, e somente a partir de um processo de renovação e
    revitalização da Capoeira Angola e do seu discurso, conduzido por Mestres como o próprio M,.Moraes, M Renê, M. João pequeno, entre
    outros, a Angola resistiu, sobreviveu ao discurso da modernidade, e voltou a crescer. Da mesma forma, em relação ao jongo, houve nessa
    época a necessidade de abrir sua prática ( que era somente masculina adulta) pra mulheres e crianças, no intuito de renová-la e garantir
    sua permanência.

    Fábio Nascimento
    ---------------

    Em 17/04/12, Mestre J C escreveu:
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    <<< No livro de Obi por exemplo, ele cita uma luta que era praticada pelos negros do sul dos Estados Unidos, mas que era altamente reprimida e escondida mesmo pelos seus praticantes, tendo desaparecido por não ser ensinada para os jovens. ( como quase acontece no Brasil, com a Capoeira Angola e com o Jongo, nos anos 80) ---- Obi, T.J. Fighting for Honor: The History of African Martial Art Traditions in the Atlantic World >>>>
    ---------
    * * * * *
    -- `a Roda, 7 mares; `a quem ta gingando com a 'invasao' do Brasil e no descobrimento, de outras culturas, artes, etc... ; Ieee!
    ----------
    PRA EDUCAR ... = Prezado Fabio, outros, gostaria, de novo, de informar que assim como o Brasil nunca foi descoberto, foi invadido!, eu nao sou o dono de nenhuma Roda Virtual, como muitos de vc/s me historiam. Mas, na REAL, como vc/s eu estou recebendo e enviando e-mails no que comunicamos.
    ------------
    Fàbio Nascimento <<< "Capoeira é tudo o que a boca come", Não quer dizer que a boca come tudo.
    ( essa postagem vai ser copiada e colada na roda virtual do Mestre JC, do mesmo modo que as anteriores)>>>
    ----------
    Estou gingando com vc/s pra adicionar pro Fundamento de Jogo da EDUCACAO que nao aceita CON-tradicao --- seja de 'angola' X 'regional', seja de outros. ^ ^
    --------
    Fabio, quando vc fala no teu texto abaixo do quase desaparecimento da pratica da Capoeira (angola) e Jongo no Brasil, porque a acentuacao nos anos 80? --- Daonde vem essa 'historia'.
    -----
    Axe'! ----

    Mestre Jeronimo - 'Iconoclast JC'
    www.myspace.com/mestrejeronimo

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  7. Vou adicionar tambem aqui o comentario que recebi e repasso pra 7 mares , gingando... Ieee!

    ----- Original Message -----
    From: ALEXANDRE SANTOS


    Sent: Tuesday, April 24, 2012 12:09 PM
    Subject: Re: favor pedir ao mestre Joao Grande para informar... (desde) a ? INVASAO-DO-BRASIL! ao Mestre Saci, aluno do M Bimba, contemporaneo dos mestres, Joao grande, Joao pequeno, Bola sete, Jildo Alfinete ...


    Opa se me permitem gostaria contribuir só com um comentário. Sou Professor Negro Tota - Bsb - Brasil.


    A dois meses tive uma visita de um africano de Angola, que me revelou uma coisa interessante ao visitar meu GRUPO. Ele disse que ao desembarcar no aeroporto de Congonhas - São Paulo se deparou com uma RODA de CAPOEIRA.


    Ficou observando, pois nunca tinha visto a tal da CAPOEIRA, curioso perguntou para alguém da roda como se chamava aquilo que estava vendo, sem saber que se tratava de RODA de CAPOEIRA. A resposta foi, se chama CAPOEIRA.


    Chegando em Brasília ele comentou com seu primo que é CAPOEIRISTA, e disse que tinha uma dúvida enorme pois na AFRICA havia coisa igual mas que não se chamava CAPOEIRA.


    Em fim, o que mais me intrigou e compartilho com VOCÊS, é que ele perguntou, VOCÊS TEM CERTEZA QUE ESSA CAPOEIRA É MESMO DO BRASIL???


    " EIS A QUESTÃO, TEMOS PROVA SUFICIENTE OU NÃO PARA AFIRMA ISSO???


    Axé a todos,


    Professor Negro Tota
    Arte Luta Brasil de Capoeira

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  8. E,,, vou tambem dar uma volta aqui nesta Roda com esta outra mensagem neste assunto que inclui origem e tradicao de Capueragem Brasileira, e, quica, de outros... -- ieeee!@

    ----- Original Message ----- From: Aga Abracces
    Sent: Wednesday, April 25, 2012 10:42 PM
    Subject: Re: atencao "estoriadoRes"... na Africa Capuera nao se chama Capoeira; Prof. Negro Tota (de Brasilia) e o mestre Joao Grande tem prova com o africano de Angola visitando o Brasil


    MESTRE JERONIMO, SOU O INSTRUTOR Aga,EU NÃO COSTUMO ENTRAR NA RODA MAIS ACHEI ENGAÇADO O COLEGA DIZER ISTO!!!
    EU MOREI POR QUASE 5 ANOS NA EUROPA (ESPANHA, PORTUGAL ITÁLIA E HOLANDA), LÁ TEM MUITOS AFRICANOS DE DIVERSOS PAÍSES. NA ESPANHA, QUANDO EU FAZIA DEMONSTRAÇÕES DE CAPOEIRA NAS RAMBLAS DE CATALUNYA ELES SEMPRE ESTAVAM LÁ FAZENDO SEUS NEGÓCIOS E FICAVAM ADMIRADOS VENDO AS MINHAS DEMONSTRAÇÕES. NENHUM DELES CONHECIA A NOSSA CAPOEIRA, EU SEMPRE PERGUNTAVA SE EM SEUS RESPECTIVOS PAÍSES NÃO TINHA ALGO PARECIDO, E SALVO UM ANGOLANO QUE DISSE TER VISTO EM SUE PAÍS O GRUPO ABADÁ, TODOS OS DEMAIS NUNCA TINHAM VISTO ALGO PARECIDO A NOSSA CAPOEIRA.
    ACHO QUE A PALAVRA DE UM AFRICANO DESCONHECIDO NÃO PODE ESTAR POR CIMA DE ANOS DE INVESTIGAÇÃO!
    QUEM ACHA QUE EU ESTOU FALANDO BESTEIRA OU MENTINDO, PODE SE DIRIGIR A PRAÇA DA SÉ EM SÃO PAULO E FALAR COM OS INÚMEROS AFRICANOS QUE LÁ EXISTEM FAZENDO OS SEUS NEGÓCIOS. PERGUNTEM A ELES COMO EU JÁ FIZ VARIAS VEZES QUERENDO SABER MAIS DAS RAÍZES DA CAPOEIRA BRASILEIRA, A RESPOSTA VAI SER A MESMA: EM MI PAÍS NO EXISTE NADA IGUAL A CAPOEIRA DE BRASIL!


    ABRAÇO

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